quarta-feira, 27 de agosto de 2014

"NUNCA SEREI POBRE DE MÉRITOS, ENQUANTO ELE FOR RICO DE MISERICÓRDIA"... [MOMENTO DE ESPIRITUALIDADE]

A misericórdia de Deus: como é bela essa realidade da fé para a nossa vida! Como é grande e profundo o amor de Deus por nós! É um amor que não falha, que sempre segura a nossa mão, nos sustenta, levanta e guia.
            No Evangelho de João, o apóstolo Tomé experimenta precisamente a misericórdia de Deus, que tem um rosto concreto: O de Jesus, de Jesus ressuscitado. Tomé não confia nos demais apóstolos, quando lhe dizem: “Vimos o Senhor”; para ele não é o suficiente a promessa de Jesus que havia anunciado: Ao terceiro dia ressuscitarei. Tomé quer ver, quer colocar a sua mão no sinal dos cravos e no peito. E qual é a reação de Jesus? A paciência: Jesus não abandona Tomé relutante na sua incredulidade; dá-lhe uma semana de tempo, não fecha a porta, espera. E Tomé acaba por reconhecer a sua própria pobreza, a sua pouca fé. “Meu Senhor e meu Deus”: com essa invocação simples, mas cheia de fé, responde à paciência de Jesus. Deixa-se envolver pela misericórdia divina, vê-a a sua frente, nas feridas das mãos e dos pés, no peito aberto, e readquire a confiança: é um homem novo, já não incrédulo, mas crente.
            Recordemos também o caso de Pedro: por três vezes renega Jesus, precisamente quando Lhe devia estar mais unido; e, quando chega ao fundo, encontra o olhar de Jesus que, com paciência e sem palavras, lhe diz: “Pedro, não tenhas medo de tua fraqueza, confia em mim”. E Pedro compreende, sente o olhar amoroso de Jesus e chora... Como é belo esse olhar de Jesus! Quanta ternura! Irmãos e irmãs, não percamos jamais a confiança na paciente misericórdia de Deus!
            Pensemos nos dois discípulos de Emaús: o rosto triste, passos vazios, sem esperança. Mas Jesus não os abandona: percorre juntamente com eles a estrada. E não só; com paciência, explica as escrituras que assim se referiam e para na casa deles, partilhando a refeição. Este é o estilo de Deus: Não é impaciente como nós, que muitas vezes queremos tudo e imediatamente, mesmo quando se trata de pessoas. Deus é paciente conosco, porque nos ama; e quem ama compreende, espera, dá confiança, não abandona, não derruba as pontes, sabe perdoar. Recordemos na nossa vida de cristãos: Deus sempre espera por nós, mesmo quando nos afastamos! Ele nunca está longe e, se voltarmos para Ele, está pronto para nos abraçar.
            Causa-se sempre grande impressão a releitura da parábola do pai misericordioso; impressiona-me pela grande esperança que sempre me dá. Pensai naquele filho mais novo, que estava na casa do pai, era amado; e, todavia deseja a sua parte na herança; abandona a casa, gasta tudo, chega ao nível mais baixo, mais distante do pai; e, quando tocou o fundo, sente saudades do calor da casa paterna e regressa. E o Pai? Teria ele esquecido o filho? Não, nunca! Está lá, avista-o longe, corre ao seu encontro e abraça-o com ternura - a ternura de Deus -, sem uma palavra de censura: voltou! Isso é a alegria do Pai; naquele abraço ao filho, está toda a sua alegria: voltou! Deus sempre espera por nós, não se cansa. Jesus mostra-nos essa paciência misericordiosa de Deus, para sempre reencontrarmos confiança, esperança! Um grande teólogo alemão, Romano Guardini, dizia que Deus responde à nossa fraqueza com a paciência e isso é motivo de nossa confiança, de nossa esperança. É uma espécie de diálogo entre a nossa fraqueza e a paciência de Deus – um diálogo que, se entrarmos nele, nos dá esperança.
            Gostaria de sublinhar outro elemento: a paciência de Deus deve encontrar em nós a coragem de regressar a Ele, qualquer que seja o erro, qualquer que seja o pecado em nossa vida. Jesus convida Tomé a colocar a mão em suas chagas das mãos e dos pés e na ferida do peito. Nós também podemos entrar nas chagas de Jesus, podemos tocá-lo realmente; isso acontece toda vez que recebemos, com fé, os sacramentos. São Bernardo diz numa bela homilia: “Por essas feridas [de Jesus], posso saborear o mel dos rochedos e o azeite da rocha duríssima, isto é, posso saborear e ver como o Senhor é bom”. É justamente nas chagas de Jesus que vivemos seguros, nelas se manifesta o amor imenso do seu coração. Tomé o compreendera. São Bernardo pergunta: Mas, com que poderei contar? Com os meus méritos? “Todo o meu mérito está na misericórdia do Senhor. Nunca serei pobre de méritos, enquanto Ele for rico de misericórdia: se são abundantes as misericórdias do Senhor, também são muitos os seus méritos”. É importante a coragem de me entregar à misericórdia de Jesus, confiar na sua paciência, refugiar-me sempre nas feridas do Seu amor. São Bernardo chega a afirmar: “E se tenho consciência de muitos pecados? ‘onde abundou o pecado, superabundou a graça’”. Talvez algum de nós possa pensar: o meu pecado é tão grande, o meu afastamento de Deus é como o do filho mais novo da parábola, e minha incredulidade é como a de Tomé; não tenho coragem para voltar, para pensar que Deus possa me acolher e esteja à espera precisamente de mim. Mas é precisamente por ti que Deus espera! Só te pede a coragem de irdes ter com Ele. Quantas vezes, no meu ministério pastoral, ouvi repetir: “Padre tenho muitos pecados”; e o convite que sempre fazia era este: “Não temas, vai ter com Ele, que está a tua espera: ele resolverá tudo”. Ouvimos tantas propostas do mundo ao nosso redor; mas nos deixamos conquistar pela proposta de Deus: a proposta Dele é uma carícia de amor. Para Deus, não somos numerosos, somos importantes, somos o que Ele tem de mais importante; apesar de pecadores, somos aquilo que lhe é mais caro.
[A Igreja da misericórdia. Papa Francisco].

           
 

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